sexta-feira, 28 de agosto de 2009

repercussões do filme "A Partida" na minh'alma

ele olhou os olhos dela.
e foi isso.
um homem olhando os olhos de uma mulher.
todas as histórias do mundo existem aí.
ele fechou os olhos e viu todas as histórias do mundo.
ela fechou o mundo e viu todas as histórias.
e como uma janela sem cortinas ao avesso
eles viram a poesia.

ele olhou os olhos dela
e a poesia sorriu.

nos rostos das pedras portuguesas
o tempo caminhava mancando
o tempo olhou o relógio
e pulsou

o homem olhou a mulher
e ela teve um filho
e eles morreram

o rio flui
o rio tenta subir o salmão
o rio faz toda a sua força
para subir o salmão
e acasalar com a nascente

de que vale o esforço do rio
para subir o salmão
se o rio vai morrer
e o salmão vai cair no mar

eu jogava pedrinhas n'água
para ver quantas batidas faria

o máximo que consegui foi
iludir a pedra

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

a cada três esquinas encontro a mim mesmo
nesse mundo e no outro
cada descoberta de América é um segredo
um mar entre os rostos

as cores explodem na minha boca
e começo a cantar uma dança
escrita nas paredes da escola
um, dois, três milênios atrás

o sorriso da mona lisa no estandarte
aparece com um feijão no dente
com a miséria do mundo
nos dentes

terça-feira, 25 de agosto de 2009

aprendi como se é preso
em filmes
bebi coca cola
e decorei as paisagens de nova iorque
em todas as décadas

corrijo na rua um assalto amador
com os movimentos que aprendi
de bandidos
dos estados unidos

sei jogar beisebol
e cantar o hino que o jimi hendrix tocou em woodstock há
40 anos atrás

uso jeans
do james dean

e gosto de samba de raiz

sábado, 22 de agosto de 2009

- Olha essas estrelas...
- É...
- Agora, você já pensou que, um dia, pode estar lá?
- Imagina.
- Às vezes eu me pego olhando as estrelas.
- Meu pai falou que era melhor eu não ficar pensando muito nas estrelas não.
- Por que?
- Ele disse que eu posso ficar maluco.
- Ah...

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

"A vida é um ringue onde não há oponente mais forte que a sua própria sombra."
Foi o que ele me disse, depois de cuspir o sangue da boca.
Minha mão estava doendo.
Foi a última vez que o vi.
Depois disso, larguei tudo. Foi como se tudo o que eu tinha construído até aquele momento não significava nada. Eu precisava sentir o vento na cara.

Na estrada as coisas ficam mais leves. O vento na cara ajuda a limpar as sujeiras da cabeça, as sujeiras que não saem no banho.
"A vida é um ringue...". Idiota. Por que? Por que? Se ele ao menos tivesse falado comigo. Mas agora é tarde. Mais um, garçom. Bares são iguais em qualquer parte. Homens idiotas e bebidas. Só os garçons tem mães. "Só os garçons...". Sem querer eu repito todas as frases dele. Dizem que até o jeito de andar, de falar, é igual. Quando falam isso me dá nojo. Dá vontade de sumir. Saí sem pagar a conta. O segurança encostou em mim. Agora ele vê dois de todo mundo.

Antes eu não faria isso. Agora, já não tenho nada a perder. Vou perder o que?

A estrada é uma coisa bonita. Hoje eu chorei, olhando a estrada. As coisas que passam, as casas ferradas, as crinças ferradas, os pneus furados, os cadáveres de cachorros. Isso me emociona. Não sei por que. Isso me emociona.

domingo, 16 de agosto de 2009

Fazendo uma poesia

Hoje, depois do almoço, estava com muito sono.
No entre-sono, quase-sono, escrevi alguns versos.
Comecei assim:

"Eu quero a ausência de um domingo"

foi a frase inicial que me veio. isso acontece de vez em quando.
uma frase vem. e dela o resto nasce. como se a frase fosse a semente da poesia.

continuei

"Eu quero a ausência de um domingo
e só"

às vezes ficamos procurando as palavras. às vezes ficamos perdendo as palavras.
então escrevi algo que estava procurando sentir. isso acontece também. você escreve como uma forma de sentir

"Eu quero a ausência de um domingo
e só
chegar ao ponto de não pensar
na vida
na morte"

às vezes você de certa forma desiste daquele caminho

"Eu quero a ausência de um domingo
e só
chegar ao ponto de não pensar
na vida
na morte
natural só um satélite feito a Lua
que é mais feio do que você"

essa última frase me trouxe o que eu realmente queria falar.
isso acontece bastante na poesia. você fala muitas coisas para conseguir achar o que realmente quer falar. aquilo então é a poesia.

a última frase me trouxe uma coisa infantil, que eu estava buscando. tenho buscado bastante uma espécie de libertação do pensamento, do jeito de pensar 'normal'. tenho tido vontade de falar como falava criança. então a verdadeira poesia começou e veio numa tacada só. com velocidade.

geralmente acontece isso. quando se sabe o que vai falar. quando você sente que ali tem petróleo, que o chão é fértil, a poesia vem acelerada.
veio assim:

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eu sou pequeno
mais menor do que um pedaço de unha
caído no canto da sala que tem uma
dona aranha cuidando
com suas patinhas e teias

eu sou bem pequeno
menor do que o brilho que tem
nos seus olhos
quando você chora ou sorri

eu sou muito pequeno
que quase sumo
quando você pisca

enquanto você lê
enquanto
essas palavras
também somem
e só restam
os sonhos, os amores, as promessas do mundo

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não sou de reescrever poesia.
pode ser um grande erro, de principiante.
ou talvez seja o meu jeito de errar.
aprender com os erros.

é difícil se criticar. O blog está ai pra isso também.
Gosto de saber opiniões, dúvidas, sentimentos dos leitores.

Ainda estou procurando a poesia.

e nunca vou achar. Ainda bem.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

a janela bate no sol
latido de passarinho
canto das britadeiras do rio
um raio de sol corta o Nilo
onde a civilização morreu

por um segundo de destino
eu não escuto a bala perdida
no longe dentro de mim
que pousou
no meu coração

a paisagem bate no sol
e fica tudo nublado
de luz

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Diálogos Catárticos - cena I

- Fui eu.
- Não acredito.
- Pode acreditar.
- Como pode?
- Não sei.
- E agora?
- Não sei. Não sei. Eu nunca...
- A gente tem que limpar tudo. A gente tem que limpar essa sujeira toda.
- Minha camisa tá com sangue.
- Eu não acredito! A gente tinha combinado outra coisa!
- Meu tênis também...
- Você tá me ouvindo! Não era esse o combinado!
- Não grita comigo não! Você não tava lá! Você não tava lá! Você não viu os olhos dele, você não tava lá e olhou, de frente, olhou bem nos olhos dele!
- Pára!
- Isso, chora, você num ia aguentar um segundo olhando os olhos dele.
- Não era pra ter sido assim. A gente falou que não ia...
- Foi um acidente!
- Como pode? Como pode? O Juninho, porquinho preferido do Dudu...
- Não sei...
- E o que eu digo pro Dudu? "Papai matou o Juninho"?"Hoje vamos comer porco, Dudu"?
- Diga a verdade. Ele já é grande.
- É. Já está quase um homem.
- Quando eu tinha a idade dele, já tava matando, e não era porco não, era gente mermo.
- Eu lembro.
- Então. Vai dizer?
- Tá. Mas pelo amor de Deus, limpa isso ai. Mais em cima.
- Eu te amo.
- Sei.
- Dudu? Você tava ai?
- Dudu, meu filho! Você tá ai há muito tempo?
- Dudu! A arma do papai! Coloca no ch...
- Gomes!!! Ahhhhhh!!!
- Mãe, fica quieta.
- Meu Deus!!!
- Fica quieta!
- AHHhhhhh...
- Agora sim. Já falei pra não mexerem no meu porquinho. Eu sempre falei pra não mexerem no meu porquinho! Vocês mexeram no Juninho, porra!!! Vocês não tinham o direito!!! Ouviu mãe, ouviu?

terça-feira, 11 de agosto de 2009

quem não chora ouvindo Milton Nascimento

não sabe o que é viver

Primeira namorada

A festa estava rolando.
Mas eu sentei no banco que tinha ali
depois de andar um pouco
o som abafado
de festa no longe

Sentei e pensei
na vida

nas palavras que não saíram da minha boca
quando ela sentou do meu lado

o silêncio sempre me acompanhou
quando eu estava sozinho

o silêncio foi minha primeira namorada

sábado, 8 de agosto de 2009

Saudade

Eu comecei catando latas. Depois transformava-as em arte. Esculturas, objetos de decoração. Quem me falou sobre isso foi o tio Roberto. Ele disse que as coisas podiam se transformar em tudo aquilo que a gente quiser, que a gente imaginar.

Então eu me transformei. Dei-me asas. Voei ao redor do mundo. Percebi que o mundo cabe na palma da visão. Percebi que a Terra tem mais água que terra. Percebi que as pessoas vivem amontoadas, tem muito espaço vazio sobrando. Bateu uma saudade. De quando eu não sabia nada.

Então eu me transformei. Cortei-me as asas. Escolhi um pequeno círculo de terra para viver. Estrategicamente escolhido, havia água, terra, sol, vento. Percebi que existe uma força maior do que podemos entender. Isso me intrigou. Decidi imaginar o que seria essa força.

Então eu me transformei. Dei-me a força. Criei, da água, da terra, da lama, um homem. Não sabendo ao certo como fazê-lo, fiz minha própria fisionomia. Terminei e contemplei. Faltava algo.
Faltava a saudade que batia em mim. Criei uma saudade feita de passarinho. Coloquei no coração do homem. O homem então chorou. Fiquei feliz.

Então eu me transformei. Cortei-me a força. Fiquei nu. Decidi virar algo inútil, pequeno, frágil, sem valor. Virei uma lata. O homem ainda vai me catar. Quando isso acontecer, passarinho vai voar do coração e pousar de novo da minha mão. Pra saudade voltar pra mim.