domingo, 29 de novembro de 2009

nas linhas do teu corpo
descubro meu país

no teu ventre
descanso e canso
no teu umbigo
mergulho e bebo
no teu seio
me abasteço
no teu sorriso
me enredo
no teu mistério
descubro cidades e metais

os teus olhos bebem o céu
e tem mais força que as tempestades

dentro deles é fácil
desfuncionar o mundo e os abismos

nessa geografia táctil
enxergar com as mãos é mais seguro
e mais perigoso

na tua pele macia, nos teus pêlos
cultivam mel e frutas
na tua bacia
dois rios se encontram
entre tuas coxas

uvas roxas
mamão papaia
framboesa e morango

domingo, 22 de novembro de 2009

Aquilo

pra que tudo isso
precipício
edifício
desperdício
de palavras
de promessas
de passados
de processos
de personagens
e engrenagens antigas

pra que tudo isso
de esconderijo preciso
de mapas
de cartas
de rotas marítmas
e salas
e pistas
e falas e calas e rimas

pra que tudo isso
de siso
de saia
de sina
de saiba
de cisma
de sonho
de somos-estranhos

pra que tudo isso
de isso
de aquilo
de grilos
de calos
de pares
e passos
e partos
e pathos

pra que tudo isso
de certo
de perto
de sermos
incertos
de insetos
e setas
e metas
e alertas

pra que tudo isso?
pra que?

se o que a gente quer é aquilo?

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

domingo, 15 de novembro de 2009

Noite anterior

Não consigo dormir
a cidade está
engolindo os silêncios
e eu pensando em você

não consigo dormir
meu coração de motor
já deu voltas na cidade
deixando um cheiro de vinho
nas moças e nos apartamentos

não consigo acordar
dessa poesia
que você sonhou

eu só posso oferecer
o que está no mundo
quando a gente imagina

nas curvas do teu rosto
na sua cintura
nas suas entradas e bandeiras
eu descubro meu país

o coração de navio
sem bússula
quanto mais perdido
mais eu me aproximo
do alvo
do teu corpo e abismo
e engano o tempo

o teu riso deforma o horizonte
pinta um pensamento
do cheiro do azul

o teu riso deforma o poente

um pouco de caos no mundo


quinta-feira, 12 de novembro de 2009

viajando na velocidade do som
o seu sorriso de combustível
atravessamos as paisagens da memória
da infância, segurando uma poesia numa mão
e um sorvete Itália na outra.

o mundo em backprojection
parece girar infinitamente
dentro de uma máquina absurda

você faz cinema com os olhos
eu só faço poesia com o mundo

caminhando com os pés no céu
de cabeça para baixo
o mundo invertido é bonito
o mundo dá pra ver melhor
de cabeça para baixo

mas quando olho teus olhos
o mundo está de cabeça para baixo de cabeça para baixo

o
x
i
a
b

a
r
a
p

a
ç
e
b
a
c

domingo, 8 de novembro de 2009

Limitedosom - vinhetas no Myspace


o projeto: vinhetas curtas, poesias concisas.
lembrando: disco do Lô (1972)

http://www.myspace.com/limitedosom

terça-feira, 3 de novembro de 2009

A Charrete

Eu lembro daquela foto.
às vezes eu me lembro daquela foto.
eu não lembro do que foi aquela foto.
eu lembro da imagem da foto.
às vezes eu sinto o que eu vi, quando tiraram a foto.
o menino estava correndo, junto com os colegas da escola, numa fazenda.
"Piperama".
o menino entrava em uma cidade em miniatura, uma cidade das crianças.
numa dessas casinhas, roupas de adulto, antigas. de quem eram?
o menino coloca a roupa e vê uma professora, ou uma dessas mulheres-senhoras que
cuidavam das crianças.
ela está com uma máquina fotográfica. ela tira uma foto.
o menino cresceu e hoje vê a foto.
o menino morreu, para nascer o garoto, e o garoto morreu, para nascer o homem.
Eu lembro daquele menino. eu não lembro daquele menino.
e na lembrança do menino?

como ele lembrará o homem?

domingo, 1 de novembro de 2009

zentimental

no brilho do sol que bate na janela
na janela do sol que bate no brilho

eu vejo só o miró do mirror
eu vejo, só, o sozinho de mim
eu vejo o Tejo e a liberdade
a pátria a morte oh liberdade
eu vejo o Oriente a oriente do oriente sorridente
o rio rente o Rio
eu rio do que vejo por que vejo o sole mio
eu canto o beijo que recebo do sol
na testa na cabeça no trem asul

zentimentos em meu peito eu tenho demais
zentimentos em meu peito eu tenho eu
o eu zente muito a minha mente
e zentimentalmente falando a gente não mente
fosse um samba seria canção
fosse uma cueca seria branca
fosse uma bandeira seria do Brasil

tenho em mim todas as respostas para as perguntas que elas geram
mas tenho em mim todas as respostas para as respostas que elas não respondem

fosse eu Deus e transformaria arte em ouro
poesia em ouro
e ouro em poesia

mas sou humano, demasiadamente humano
e só opero equações de primeiro grau
e ditado com 10 palavras. ponto final.

eu aprendi na escola como escrever as palavras
mas o significado eu aprendi na rua
em todas as minhas pequenas mortes
e pequenos nascimentos
em todos os cuspes e tapas na cara
e carrinhos do futebol

se você queimou aquelas poesias
feitas de caderno amarelo e lápis
só fez questão de ilustrar o que estava escrito
cinzas e promessas e futuros já passados

poesia de criança só serve para queimar papéis
e embrulhar balas ice-kiss

a verdadeira poesia
ficou guardada no meu futuro

a verdadeira promessa
já pegou o primeiro ônibus escolar

a verdadeira canção
eu cantei e esqueci

estou de pé e pulo e grito e gesticulo com o abismo
numa luta eu me domino e continuo a continuar
piso duas vezes no mesmo rio
jogo a piada no lixo
e planto um som no mundo