segunda-feira, 3 de abril de 2017

estórias que escrevem pessoas

se na tv o casal quase que se beija, 
bom,
eu prefiro olhar a reação dela
um caracol de óculos no futon
- pára de me olhar olha pra tela!

eu não gosto dessa série
é muito de menininha
eu não gosto... 
- hahahaha,
esse número me anima!

existe uma quinta dimensão
daquelas conhecidas pela humanidade
que trama...
mas não é além da imaginação
fica logo ali na nossa cama

não preciso de ficção científica
nem de comédia romântica
o paradoxo de ver você, tendo você, sendo você, amando você
- um coração que anda
dobra as leis da física quântica

e mais uma florzinha brota na varanda


segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

1

uma fogueira na praia de maricá
um cachorro vagabundo 
viralata em guapimirim
a geografia feminina dessa cidade
que já não é a mesma

shopping
estamos no shopping
consumindo
estamos consumindo
(cantar isso no ritmo de o meu sangue ferve por você)

um trio big bob adiantando
um moleque soltando pipa
um idiota de quadriciclo
suco de caju da fruta

as marcas de bolinha da espreguiçadeira de madeira
vassoura elétrica
os discos da rita lee, gil e secos e molhados
o violão de 12 cordas quebrado
as bananas podres

um balde d'água nem com veja tira o aedis
tem deixar escorrer pelo ralo
lista de compras na porta do escritório
uma sunga para secar
muito picolé de macurujá
4 de novembro

os passarinhos da janela não comeram canjiquinha
o fora ccr me adicionou no face
encontraram um rato perto do refeitório
com pouco carvão o negócio é pegar lenha

comecei dois mil e quinze cagando na beira do rio
é uma sensação de libertação
dois mil e dezesseis começa com aquela camisa azul xadrez
a base estabelecida para voar
fritada mista com alface e tomate
bobó de camarão revisitado

e as portas da casa para pintar colorido

sexta-feira, 6 de março de 2015


é como se eu não tivesse o que dizer
mas tivesse muito o que mostrar o que movimentar o que fazer

parece que alguém quer cantar

parece que alguém quer cantar
mas não consegue

o motor do ar-condicionado central
parece que não entende a temperatura
no visor aparece 19 º, mas é mentira

a maçaneta da porta parece que quer girar
mas a ferrugem entre o metal desgastou o movimento

uma canoa antiga, dos índios, foi achada
no interior de minas gerais

acabou a tinta de uma máquina de escrever Olivetti
que era da minha avó

alguma formiga com certeza está sendo morta
com um pisão
nesse instante
porque andava distraída demais
por entre papéis importantes do escritório

parece que alguém
lá, atrás daquele prédio
quer cantar ou gritar
mas não consegue

eu sei que o faxineiro que limpa os banheiros aqui
gosta muito de cantar funk melody
não era ele quer cantar e não consegue
é alguém diferente
mas ele também não consegue

o sol teve alguma preguiça
e só apareceu na metade da janela
da minha casa

minha caneta caiu no chão
atrás da mesa
eu tentei me esticar, mas acabei caindo da cadeira
a caneta, eu acho, está ali atrás ainda

e sem escrever
eu acho que sou a caneta com que deus desenha alguma bobagem
enquanto as galáxias dançam

alguém na praça da cinelândia queria cantar alguma música
eu acho
mas não consegue

o calor agora já diminuiu, acho que o ar voltou a funcionar



segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

verdes

eu atravesso uma baía todo dia
atravesso cidades, cabelos, sinais
transpasso ferrugens, miolos de pão, morcegos
atravesso as linhas da palma da mão
os pedestres passados futuram-me
num tempo presente já findo
eu atravesso estações sem mapa
sem tênis, sem calos nos pés
eu atravesso o mar todo dia
atravesso sofás boiando
na beira da visão
mas canso
e paro

atravessar a noite em sonhos verdes

amarela

os peixes de seda
em cima da mesa
voa uma abelha
no lustre da sala
dorme na rede
amarela
o corpo da bela
janelas do quarto
abrindo a tarde
o sol ao contrário
de ponta cabeça
reflete na mesa
amarela
os peixes de sede
abelha que pousa
no lustre da sala
enfeites de luz


quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

uma noite qualquer

no meu quarto
à noite
ponho-me em silêncio

de pronto os grilos dormem alto
na paisagem desse silêncio
cães conversam sobre ossos
carros insistem em descobrir o fogo
e o calor de estar vivo
põe preguiça até nas estrelas
(cogitam parar de brilhar)

meu corpo quer dizer algo
ou melhor, quer dançar algo
mas faltam-lhe palavras
ou melhor, sobram-lhe sonhos
de modo que é fácil se perder

em cada nervo uma gaveta
nas dobras do joelho cultivo sonetos
no suvaco, descrevo poentes com o suor
e em cada vértebra os versos vergam vocábulos
que, tortos, desabrocham na superfície aberta
da mente

seria mais uma noite qualquer
não fosse essa gritaria toda



quinta-feira, 18 de setembro de 2014

barca da visão

hoje na barca fiquei em pé em frente ao portão vazado na proa
olhando o rio de janeiro se aproximando da visão
os prédios altos, o centro da cidade, as artérias da cidade
os prédio baixos, o centro histórico da cidade, as veias da cidade
enquanto no fone de ouvido a trilha sonora fazia daquilo tudo um cinema

hoje a baía de guanabara me atravessou
como uma barca atravessa um prédio
como uma cidade atravessa a visão
como a visão atravessa um cinema
como um cinema atravessa um corpo de gente

como um corpo de gente é menos espesso que um corpo de coisa

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

scenas urbanas

um mendigo vestindo uma camisa escrito pantanal inundando o centro da cidade ao meio-dia
do alto do arranha-céu somos todos formigas carregando pedaços de folhas mais pesadas que a alma
um silêncio atravessa o sinal vermelho antes que o cego de bengalas pudesse ver

segunda-feira, 5 de maio de 2014

no teto da casa

no teto da casa
comer guacamole
cerveja e pimenta
a vida é pequena
pra que tanto rio?

no teto da casa
falar besteira
contar as estrelas
o som das abelhas
dançando no frio

o casamento do cedro com a araucária
um abraço de nuvem no teto da casa
uma chaminé, um chamamé
o mundo girando no teto da casa...

no teto da casa
ver a namorada
deixar o vestido
de flor amarela
confundir o poente

no teto da casa
saber o tempo
de colher estrelas
o céu nas telhas
chamando o vento

o casamento do cedro com a araucária
um abraço de nuvem no teto da casa
uma chaminé, um chamamé
o mundo girando no teto da casa...

terça-feira, 29 de abril de 2014

deriva

andar à pé sem rumo
no meio da cidade
achar um atalho
um mijo de cachorro
que leve a lugar algum
ver, inventar, ser setas
ser sinais abertos verdes
abrir asfaltos com o dente
cavar o céu com os pés
andar à pé sem rumo
no meio dessa gente
enquanto o dia queima
veludos pelos ares
em ruas sem saída
achar por entre árvores
um ninho passarinho
achar por entre carros
e lixos retorcidos
um ser humano bicho
deitado em papelão
andar à pé sem rumo
sem sulco nos sapatos
no meio da saudade
buzina um coração
é tudo coisa falsa
me diz a consciência
são vidros e vitrines
comidas e bebidas
e gente no celular
andando pelas ruas
descubro uma pessoa
que veio do ceará
e canta titanic
com voz de violino
passeia com cachorros
de uma senhora morta
descubro um porteiro
que rega passarinhos
com água e açúcar
que manda nessa rua
sem saída para o mar
descubro um ponto nulo
por entre outros postes
onde se vê escrito
algum amor ou ódio
invento essa estória
e depois esqueço
andar à pé na rua
sem rumo e sem sapato
será que é verdade
boatos de assalto
ali naquela esquina
alguém perdeu sandália
é tudo da cidade
perdida em-si-mesmada
andar à pé sem rumo
esquecer que existe o tempo
supor que atrás do muro
alguma vida dorme
alguma vida acorda
e tudo é o que invento
no meio da cidade
descobrem-se rios
imaginários
e nos olhos dos pedestres
nos pés dos automóveis
alguma coisa vive
alguma coisa morre
lembrar que um dia a gente
andou por essas bandas
lembrar que a gente é só
que a gente é um mundo
lembrar que os pés doem
de tanta alegria
andando à pé sem rumo
à deriva

segunda-feira, 21 de abril de 2014

na minha beira

vive no canto da boca um canto sem boca
como paisagem perdida no canto do olhar
foi como a flor esquecida num canto de moça
ou poesia de areia nas beiras do mar

fotografias e rimas de um cego caduco
sonho do eunuco de um dia ser imperador
fruta madura que sonha um dia ser suco
vive na beira do ódio esquecido um amor

se procurar dentro da viola
a melodia na beira da corda
um som azul

se procurar no canto da boca
aquele beijo de beira de moça
um iguaçú

e se procurar por um espaço
pelas beiras entre seu abraço
um corpo nu

não vai encontrar nem mesmo o canto
onde se escondia por enquanto
o que eu fui

lembranças sem ter fim na minha beira
é de nascença em mim um mar pirata
tesouros que perdi por cordilheiras
tem mais presença em mim o que me falta

é de nascença em mim um mar pirata
tem mais presença em mim o que me falta

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Talvez

talvez seja essa noite
deitada em minha janela
talvez seja o vinho tinto
na minha camisa velha

talvez seja essa rua
por onde o silêncio ia
talvez seja só eu mesmo
querendo ver poesia

talvez seja esse tempo
de nuvem e chuva fina
talvez é o pensamento
a meteorologia

talvez seja essa insônia
que bebe meu corpo ao poucos
talvez seja o meu silêncio
gritando até ficar rouco

talvez seja o fim do mundo
ou só é saudade dela
talvez seja essa noite
deitada em minha janela

sábado, 8 de março de 2014

pensando em coisas que o Suassuna disse numa palestra

ainda preciso entender Canudos
para entender o Brasil

dar de presente uma pedra pequena, dessas comuns, de beira de rio

guardar pedras por mais de 50 anos, dessas comuns, pelo valor sentimental
pelo desvalor

guardar pedras em vez de guardar coisas úteis

dar presentes achados no chão, no mato, no rio
em vez de comprar camisetas na hering no amigo oculto do natal

ainda preciso dar as camisas que não uso

e dar mais tempo ao não-uso das coisas usáveis
de forma que o tempo não me use

púrpura

a casa completamente silenciosa
a cidade também
há todo um sentido no ar
projetos de vida
sonhos
a imaginação das pedras montanhas grilos
os sonhos dos mendigos

o cristo redentor vestido de luz roxa
no dia das mulheres vestem cristo de púrpura

tento me fazer mulher
para escutar as águas que escorrem
os fetos que gero

uma garrafa de vinho
minha vó, carol e queijos
põem a gente emocionado como um cristo de vestido púrpura
de braços abertos

dançando valsa com o silêncio do rio

terça-feira, 17 de setembro de 2013

picolé itália

procurando uma concha numa praia
importa se é bonita, feia, quebrada?
coisa concreta, concha, ou espiral inventada
o que é preciso é o som do mar estar dentro

lugar náufrago
é pele de gente

ilhas lá longe me avistam
terras à vista me perdem
águas profundas me dançam
longe lá na infância

inda quero descobrir conchas raras
ainda quero um picolé itália

sábado, 3 de agosto de 2013

contar causos num bar

contar causos num bar
rir desses causos
relembrar uma idiotice
que a gente fez menor
e rir da idiotice

conversar com estranhos
até virar grandes amigos
inventar futuros
diferentes fins

tragar um fumo
olhar a fumaça se misturando com a luz

segunda-feira, 29 de julho de 2013

domingo, 28 de julho de 2013

rodovia

janela do ônibus
de um ônibus entre milhares de outros que ninguém sabe onde estão
(e se soubessem onde estão, o que saberiam?)

dais para o mistério de cidadezinha qualquer
vida mixuruca
constantemente cruzada por caminhões
com os cartazes mal-escritos a anunciar lojas e igrejas
com os móteis com nomes de músicas de roberto carlos
com essa solidão lotada de gente
e esses vira-latas mancos a esmolar pedaços de pão e carinho

(vivi, estudei, amei, e até cri
e hoje
não há mendigo na beira de estrada que eu não inveje
só por não estar nessa janela do ônibus)

não há nada que aconteça
nessas cidades
nunca nada vai acontecer
não se pode querer que aconteça nada
à parte isso, vem na janela um homem sem dentes
que diz ser Deus



terça-feira, 23 de julho de 2013

quarto

estou nesse momento
no seu quarto

em cada pedacinho dele
eu lembro do espaço que nossos corpos criaram
ocuparam
em cada objeto tem um pouco você
tanto que a saudade se torna quase
insuportavelmente acolhedora

é uma ausência tão grande que preenche tudo

(as ruas lá fora estão cheias
ouço gritos
grito também)

mas no seu quarto a maior presença é a sua falta

olho para o armário
consigo visualizar nós dois sem roupa
entrando em transe
olho para as fotos em cima da mesa do meio
uma ausência sua muito presente
de vários passados
o ventilador ligado
circula um ar que também contém fragmentos seus
e esse ar passa na minha pele
e é como se fosse a sua falta que me soprasse de leve

(soube que aquele seu amigo foi levado preso,
estava filmando com o celular e já foi liberado)

é como se me faltasse um órgão essencial
sangue, oxigênio, não sei
e ao mesmo tempo
eu estivesse na mais equipada incubadora
com tudo para me fazer saudável, respirar
seu quarto me dói como um parto bom

o seu toque está em cada objeto
no diprosalic
nos controles remotos
nos florais
no estojo
nas moedas
na maçaneta da porta
o seu olhar nos olha
do quadro dourado do beijo
da tela escura da tv
da tela acessa do computador
do teto
dos seus próprios olhos nas fotos
e penso que nunca fui olhado tão desprotegido
sinceramente real
com essa tristeza calando fundo
e essa alegria de saber que você volta em breve
e essa coisa que chamam amor
que se mistura em tudo que penso, faço, imagino, sou

(o cheiro de gás ainda está forte na camisa. até saiu o teu cheiro)

segunda-feira, 8 de julho de 2013

ela deita sobre a grama

ela deita sobre a grama
o céu é que se derrama

ela sonha com o sol
o sol é que lhe acorda

em alguma paisagem
remota
traz beijos na bagagem

cartão postal é música
teu corpo é túnica
com que vou falar com deus

olhos virados em júpiter
você louca

e eu aqui
deito sobre a cama
a noite é que se derrama

eu sonho com a lua
e a lua é que me dorme

em alguma saudade
próxima
trago beijos de verdade

cartão postal é o rio
teu corpo é um rio
com que vou falar com deus

à nado
há nada

terça-feira, 2 de julho de 2013

a incrível surdez branca de ouvir o grito silenciado da noite

o mosquito que fica no ouvido
as sirenes da polícia lá longe
um casal de grilos
o gerador do hospital aqui da rua
o estalo da geladeira
meu coração de saudade

o motor de um carro
algumas fotografias suas
o disco muito do caetano
a luz vagabunda da luminária
o arrastar de uma cadeira no apê de cima
a incrível surdez branca de ouvir o grito silenciado da noite

meu coração de saudade
inventa modos de dormir
pra esquecer um pouco essa saudade

cão manco

um cão manco pelas ruas de uma cidadezinha mixuruca
ele seguia qualquer um
qualquer um

como se fosse seu dono

eu acho que vi deus
nesse cão manco

e ele me viu também
e eu fui perdoado

grilo

essa dor de cabeça que martela amplidões pela noite
abre a paisagem noturna dentro do corpo
um grilo ao longe me diz que estou perto de encontrar a escuridão
não dá para enxergar o que se pode enxergar
apesar disso
temos em nós todas as dores do mundo
sem doer nada

é só madrugada

segunda-feira, 1 de julho de 2013

a tua ausência

a tua ausência
soma para menos
subtrai para mais
ilusões de acenos
beira de um cais

quinta-feira, 9 de maio de 2013

eu achava

eu achava que a poesia estava verdade ou na mentira
em qualquer lugar
faltava ainda descobrir
que todos os lugares ainda
não bastam

eu achava que a poesia estava na verdade
dizer as coisas dos jeitos que elas são
dentro da cabeça
mas principalmente
fora do corpo sendo o corpo
tomar de uma vez o mundo
como quem engole chamas

eu achava que a poesia estava na mentira
se colocar em um estado de transe
achando a frase inicial
o personagem inicial
um louco, idiota ou deus
"a poesia é uma linguagem desviante, é preciso primeiro achar quem vai escrever"
uma vez um poeta me disse isso
e eu ouvi.

o porquê de não estar escrevendo com a mesma intensidade de antes
eu não sei exatamente

eu achava que era importante explorar o fluxo
ligar uma musica que continuasse que empurrasse a mente e a vontade de escrever pra frente
alongar os parágrafos alongar as frases deixar as associações se estabelecerem num jogo constante que vai e vai

ouvir miles davis ou outra coisa qualquer que seja boa para despertar a consciência

eu achava que precisava editar mais o que escrevia
não exatamente para embelezar
mas achar a forma certa
a frase certa
ser cuidadoso
mais caprichoso com as palavras

eu achava que ser poeta tinha a ver com a maneira de vi-ver o mundo
de ser o mundo
e de não ser o mundo
e então não haveria tanta necessidade de se preocupar com a polidez da linguagem

e volta e meia a linguagem te pega
te joga na cadeira e te faz ser

manter o ritmo é importante manter o ritmo
construir uma casa sólida com as linhas que vem e vão
e é isso que vou fazer não me importanto com o resultado final

uma trilha de rastros
deixados por um cão surdo
ninguém sabe onde vai dar
ao menos na música é coletivo
você está junto de outros
no teatro também
agora talvez o problema ou solução da escrita seja a solidão

eu achava que era preciso inventar e ser outros ao mesmo tempo em grande diálogo ou confusão ou briga ou festa
e escrever era deixar que elas se amassem no papel
por uma noite

por uma noite
as palavras geram inícios de poemas



terça-feira, 5 de março de 2013

até

um dos meus avôs veio do pantanal
o outro veio do japão
nasci na holanda
sou brasileiro
nasci num clube da esquina
no encontro de várias ruas
andei de skate
coloquei o pé no pacífico
vi a torre eiffel ascender suas luzes
numa paris sobrenatural
provei vinho de mendoza
senti a brisa de uma geleira derretida
pelas bandas do canadá
tremi com um terremoto na costa rica
e subi num vulcão lá
dizem que três vezes por ano
quando o céu está totalmente aberto
dá pra ver o pacífico e o atlântico
indefinir o longe e o perto
de cima daquele vulcão
um dia quero ver...

já morei em frente ao mar
já quase me afoguei
tive amores imaginários
alguns amores deixei
vi um céu muito estrelado
de dar dó
lá em visconde de mauá
e a cachoeira mais bonita aquela
acho que foi em serra do cipó
parecia um lugar de sonhos
de repente era

não canso de ver
o horizonte do arpoador
olhar o mar sem pressa
seja de onde for
funciona pra mim como uma reza
de repente é...

quando eu nasci
uma anja loira, alta, holandesa
disse: vai, Taiyo!
ser outros na vida
navegar é precioso
vai ser outros
outras pessoas
fazer poesia

do pantanal eu trago uma pré-história
um gosto de antes dos começos
como tocar no mar pela primeira vez
achar os olhos da mãe e do pai quando bebê
do japão tem um olhar invertido
olhar o que está dentro
do brasil eu colhi um sorriso
a alegria de estar vivo
da holanda um olhar subversivo
como jogar uma bicicleta num canal

nasci mesmo foi numa esquina
na esquina entre o bem e o mal

caminhando em saltos
pulando moças, cheiros, apartamentos
até encontrar aquela visão
que eu tinha desde pequeno
 até ver o meu sol,
viver, meu nome, viver
escrito em corpo de mulher

até encontrar carol

é quase primavera

paisagem de sonhos
na janela da nossa casa
é a vida que pousa
em nossas mãos
parece um filme que eu vi
há um tempão atrás

casa verde
a grama verde
o cheiro de chuva
parece que é sua
essa beleza das montanhas
caminhando em teus quadris
para ver o sol se pôr
no seu umbigo
beber água

passo por essa terra
ou a terra que me caminha
ou o céu que navega sobre mim
um passarinho pousou no seu ombro
deve ser de deus

um bando de estrelas voam
paisagem de sonhos
é quase primavera
promessa de te ver
fecundando o chão
nos teus cabelos a brisa rega
nesses teus cabelos pretos
escuridão que ilumina
minhas mãos entrelaçadas
rezam
tranças
transe
tons
de verdes heras
é quase primavera

meu amor

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

diários antigos da carol

a carol é poeta:
hoje ela achou
diários antigos
e me falou
- é bonzão se perder no que a gente acha.


terça-feira, 29 de janeiro de 2013

então era isso

então era isso
eu já imaginava
faltava alguma coisa
nessa madrugada
algum claro enigma
decifrar o som do nada:
faltava escrever isso

que coisa louca
não se pode mais dormir
é preciso trocar essa reza
de cabeceira
por um poema
de canções surdas

só eu vou escutar mesmo
aquilo que nunca cantei

enquanto você que lê
inventa uma cobra coral
dentro do corpo
como uma serpente mitológica
engolindo o próprio chakra
enquanto isso o poema se consome
e some

então era isso
era preciso ser outros
era um caminho impreciso
ser outras pessoas
orientar-se pelo oriente
faltava achar a voz
bem baixinho

seria preciso desfazer o ritmo
para dançar
o movimento de ficar parado

a superfície impenetrável do ar

moon dreams

ouço essa música
e consigo ver nós dois flutuando
só um pouquinho acima do chão
num musical inventado
em preto e branco
na orla dessa cidade
e a lua cheia sorrindo no céu

a lua sonha a gente


solo 1

flores na janela da sala e eu pensando em alguma coisa para melhorar a minha vida e a de meus semelhantes não olhar pra trás não olhar para trás jamais seguir andando seguir os Andes

flores na chuva
cidade cinza
nuvem solar
achar a comida de pássaro e voar

teus olhos separam o que é real
obrigado, flores
flores na chuva
eu só preciso continuar seguindo
continuar na chuva

minha floresta de mims
nasce, cresce, morre e nasce

natureza morta
vivendo em quadros
na paisagem mental

podem ser girassóis
podem ser apenas o verde das árvores
ou serei o verde em mim que se faz humano

natureza morta
flores na chuva

yin e yang
ali naquele escuro

júpiter sincero aguarda um estalo
entre o solo de silêncio e luz
dos parâmetros tortos na calçada
ela pula um cocô de cachorro
com a leveza cega de um Nijinski

motocicleta feita de vento
impossível conter o movimento
motocicleta feita de corpo
espaço aberto ao vigilitante desatento
solos que a cidade esqueceu
um saxofonista rasteja nú pelo chão
sobre um cimento ciumento em cima no centro
próprio umbigo
vão




quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

esperar

escrever até entrar em transe
reconhecer que não é você ali
mas é mais você do que se fosse

esperar a noite chegar
o silêncio gritado dos animais
atrás, atrás do morro do prédio

esperar o silêncio dos apartamentos
as janelas quase fechadas
algum radinho de pilha bem baixo

esperar que o eco dos cães
se perca no próprio escuro da noite
e de alguma forma se transfigurar em latido

esperar que o som desencontre o seu sentido

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

ossos de tijolo

não é que não há nada para ser escrito
pelo contrário

eu poderia falar dos moleques aqui do play
falando alto
e já é madrugada

ou da noite
falar de como está quente
repetir de novo aquela estória de
"a cidade dorme"
ou outra merda qualquer

de qualquer forma não ligo
to pouco me lixando

a gente continua a falar
ou escrever
para escreviver
serestar na madrugada
quase nada

não é que tudo tenha que ser escrito
mas quase

eu tive um professor
um mestre
chamado Evaldo
e ele escreveu um livro chamado
"Retalhos do Quase Nada"

eu gostei muito desse título
gosto até hoje

o manoel já disse que escrever nadas
ajuda a gente a ficar mais cheio de ocaso

de noite, na parede do quarto, os ossos de tijolo do prédio exalam ócio

domingo, 6 de janeiro de 2013

ouvindo coltrane

a noite vai vestindo o seu manto negro sobre as coisas imateriais
e eu percebo o quanto não existo
madrugada cai da janela do quarto
foge no passado um som dissipado
estranho
já sonhei com esse lugar
antes
negras curvas do corpo iluminado
uma moça triste sorria
um pássaro sorria
na janela do passado
e lembro de uma estória

tínhamos apenas um segredo
eu e ela
eu era uma porta
e ela uma janela

ouvindo john coltrane
deixando que a escuridão
queime

ouvindo toninho horta
fico sentado no chão
olhando a porta

ouvindo djavan
parece um dejavu

nesse sonho ou pesadelo
seu rosto vem distorcido
onde tudo é mais bonito
eu arranho seu cotovelo

um amor supremo

está mais quente
faz calor no rio de janeiro
até o vento sente
e se esconde 

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

buraco negro

hoje vi na tv
que os cientistas
os físicos teóricos
e outros lá
não sabem o que acontece
dentro de um buraco negro

parece, dizem
que o tempo e o espaço
somem

ah, mas isso eu já vi
o manoel de barros
e outros
fazem isso dentro da gente
quando a gente lê uns trecos deles

fernando pessoa geralmente manda um desses

ou, melhor,
quando os poemas lêem a gente

afinal
se não fosse os poemas
a gente seria o que?

os cientistas
e os físicos teóricos
sabem que a gente é um homo sapiens sapiens.

eu eu lá quero saber de saber?

kombi do carlos

passeando na kombi do carlos
a gente era astro de rock`n roll
ouvindo genesis, sabbath e zepelin
no som alto que não tinha fim
cortando as ruas do rio no sol
passeando na kombi do carlos


terça-feira, 11 de dezembro de 2012

dúvida

ela sai do banho
está calor
a nova roupa
já veste suor

foi ela que tomou banho
ou as águas da ducha que se banharam nela?

sempre fico na dúvida


uma cidade de poesia

viajar significa ver
a paisagem desaparecer
num cinema real
que se imagina
por uma janela
fechada na lembrança
de ventos perdidos

viajar significa ver
por cima das nuvens
um chão que é nuvem
e um céu que é mar

e o amor
que é

viajar significa ver
de olhos fechados
o tempo escorrer pela janela
enquanto o espaço entre nós
passa

viajar significa ver
o silêncio das cores de uma noite

em direção a Santiago
penso em escrever um romance
onde possa explorar
as implicações poéticas
da vida concreta e cotidiana
de se escrever

estar em constante viagem
significa estar em movimento
parado

movimentar parado é exercício
de poeta
ele precisa estar em movimento
e estar parado em movimento
desenvolver uma audácia para
as origens
chorar páginas dos olhos

estou sentado na grama
da praça em frente ao La Moneda
e uma bandeira do Chile
é que faz sombra
o sol é bem forte
mas gostoso
o vento é delicioso
o vento faz carinho na nossa pele

os cachorros de rua de Santiago
são dóceis e bonitos
me lembraram na preguiça
os cães de Salvador

tenho pensado na relação
entre as cidades
entre os países da América Latina
estou só de camisa e calça jeans
no sol, você fica com calor
na sombra, o vento é bem gelado
microclimas

é definitivamente uma cidade
de poesia

terça-feira, 27 de novembro de 2012

sonhos recentes

hoje sonhei com piscinas
estava numa espécie de clube
havia uma exposição de arte no local
com videos e instalações

outro dia sonhei que estava numa celebração religiosa
muçulmana
depois judaica
em um templo, na verdade, embaixo dele
numa estrutura de pedras e sacos de areia

num outro sonho eu via um pai e um filho
numa espécie de treino de sobrevivência
em situações extremas
eu brincava com duas armas na minha mão
uma não tinha tambor

noutro sonho
a carol tinha comprado uma moto
e eu andava rápido pela cidade

em outro havia uma novela estranha
onde o protagonista cortava a orelha da mulher


segunda-feira, 19 de novembro de 2012

dos momentos em que a amo

quando sorri envergonhada por saber-se bela
quando chora alegre por consolar-se em mim
quando abre o sorriso quando abro a porta
quando fecha os braços e pernas em torno de mim

quando descobre uma música perdida na janela
quando perde a vergonha de saber-se bela
quando dança em qualquer lugar que haja música
quando pára diante de mim e diante da janela

quando escreve poemas como quem penteia o cabelo em frente ao espelho
quando se deixa escrever por meus poemas, beijos e sonhos pagãos
quando desenha com gestos o que sente por dentro, inventando-se
quando se deixa criar-se no gesso que moldamos à quatro mãos

quando cozinha um peixe com molho caseiro
quando aprova meu macarrão com molho curry
quando sozinha se toca ligeiro
quando comigo se mistura

quando vê desenho animado na cama
quando de olhos fechados se anima
quando emburrada se inflama
quando tranquila e em mim se menina

quando dorme
quando acorda
quando morde
quando joga

dos momentos que a amo
prefiro todos
prefiro nenhum

e os momentos que a amo
são todos os mesmos
essa sexta-feira
que ainda não acabou
que ainda nem começou

o momento mais bonito
- infinito

dos momentos que a amo
só me lembro de um


sexta-feira, 16 de novembro de 2012

a frase

"o ar está cheio de murmúrios silenciosos"

essa é a primeira linha do primeiro livro do vinícius, chamado - O Caminho para a Distância.
eu curto pra caramba esse nome, o caminho para a distância.
se você mora no rio, de repente, se colocar a cabeça pra fora da janela e olhar lá fora, vai conseguir olhar essa frase do vinícius.

a frase até pousou na minha janela hoje.

minha identidade também está lá

perdi o medo de escrever poesia há muito tempo, mas parece que por agora, estou perdendo o medo de escrever prosa também. eu e minha namorada tivemos nossos roteiros selecionados para um laboratório de roteiros. de curta-metragem. cada um com um roteiro diferente. foi bem legal. engraçado que o roteiro de ambos falava sobre relacionamento de casal, cada um da sua maneira. tanto que fomos colocados no mesmo grupo de trabalho - apelidado carinhosamente de grupo do amor.

lendo o roteiro de cada um dá pra perceber coisas sobre nosso próprio relacionamento. e também ver, de alguma forma, como cada um vê ou já viu um dia. o meu se chama Bebel Berlin e o dela se chama Expresso. eu gosto dos dois nomes. gosto dos dois roteiros. cada um tem uma cara. o meu é mais anárquico e chega a ser imbecil. o dela é mais bonito, parece coisa de filme asiático contemporâneo.

escrever roteiro parece um pouco como escrever em prosa e escrever em poesia. só que é diferente. tem muita tradução num roteiro. você fica traduzindo a língua das imagens da mente e dos olhos e dos ouvidos. cada imagem dessa tem uma língua diferente, então é uma tradução simultânea danada, que às vezes comete erros. o melhor dessa tradução são os erros. como na poesia, quando a criança erra na gramática, acerta na poesia. na poesia parece que não há tradução, no caso, quem traduz é a própria poesia. ela te lambe, lambe a tua língua, e deixa a baba nas palavras que sobraram. a prosa é mais como um ditado, você vai vendo de ouvir.

tenho ouvido daft punk e entendido melhor o porque de estar ouvindo daft punk. tem tudo a ver com tudo. inicialmente o que mais me atraiu foi o clip do gondry para a música around the world. percebi que gosto desse diretor. justamente porque ele trabalha num lugar que também gosto, ele fica fazendo muitas coisas do início do cinema, coisa de méliès e lumière. e daft punk é como se fosse manoel de barros em forma de música tocado não por gente, mas por objetos de um ferro velho. repetir, repetir, até ficar diferente.

quando vi viagem à lua do méliès percebi o caminho que o cinema que quero fazer e ver mais deve explorar. viagem para lugares nunca antes vistos. por isso que a galera gosta de apichatpong weerasethakul, cineasta tailandês. ele mostra coisas que a gente nunca viu. nem ele viu. ele mostra coisas que até a gente não está vendo.

e continua de pé, agora mais forte e já iniciado, o tal roteiro de longa-metragem que estou escrevendo. por alto, eu sei que ele fala da paesificação do rio e das coisas. dessa transformação rápida de tudo em barra da tijuca, em babaquice. mas, por mais louco que seja, quero que seja um filme pra cima. vai ser uma comédia. sobre a paesificação do rio. eduardo paes. não vai ser sobre isso, mas esse sentimento vai ficar no filme. de repente eu posso apontar alguns caminhos pra despaesificação, como a poesia e etc. o mais interessante no filme é esse etc. eu nem sei o que tem. mas sinto que vai ter coisa bacana.

todo escrito é uma estória de amor. e eu só escrevi essas merdas todas porque tô com saudade da carol.

o rio tem amanhecido meio frio. tem feito um climinha bem de feriado daqueles tranquilos. feriados pra ficar em casa. eu até gosto. dá vontade de ficar na cama lendo alguma coisa. ou baixar um filme. tava vendo ontem o hana-bi, fogos de artifício, do takeshi kitano. me pareceu um filme bem interessante. achei maneiro o jeito que ele fez esse filme. um dia, quando eu for mais velho, gostaria de ter essa cara de mafioso da yakuza. vai ser difícil, afinal, ele ganhou aquela cicatriz e aquele tique nervoso de paralisia por causa de um acidente de moto em 94. mas ter uma cara de mafioso seria bom. dá pra intimidar as pessoas. isso numa cidade grande é importante. principalmente flanelinhas.

parei agora para ficar olhando o quarto e procurando um título para esse texto. acho que já está bom de escrever. chega. olhei os livros na estante. o ventilador meio velho. meu armário que tem as portas quebradas. a janela que ainda está semi-aberta. posso até ver o verde e o cinza lá fora. e escutar os pássaros. ao meu lado tem um livro do drummond com a cara dele na capa. do outro tem kafka naquela edição da martin claret feia pra cacete. a calça que eu usei ontem está pendurada com cinto e tudo. ainda tem moedinhas no bolso. tenho que pegar. minha identidade também está lá.


quarta-feira, 7 de novembro de 2012

daft punk e méliès e manoel

remix
remix
remix
uma trucagem de camera
uma trucagem de camera
uma trucagem de camera
umas latas no chão
umas latas no chão
umas latas no chão

até quando a repetiç
transfone

até te te te te te te te até
quando quando quando quando
ando ando ad admp adp admp admpad mpad mpad mpad padmpad pm

deu erro no computador
enquanto eu gdigitaava afora deu tambem mas eu vou continuar a escrever ate que ele volte e asasim nao vou conrrigir quando ele voltar


quarta-feira, 31 de outubro de 2012

tudo trocado

vai-se até o arpoador de bicicleta
para não gastar dinheiro com ônibus
até porque não tenho troco

mas tudo trocado

sobe nas pedras
e olha o mar

de novo
lembro de nós dois nus
com o mar batendo na pedra
e fazendo espumas

lá no horizonte
dá pra ver monet

de perto
toda pedra é um ser
mais importante do que eu

seria melhor que as bicicletas
carregassem homens
e descansassem nas pedras
e que o mar olhasse a gente
e lembrasse de uma transa
dele com o tempo.

tudo trocado.

ontem não dormi por causa dos mosquitos

ontem eu não dormi por causa dos mosquitos e do calor
e também porque estava com muitas coisas na cabeça
fui ler walter benjamin para ver se dormia
fiquei com mais coisas na cabeça ainda
e mais calor

mas os mosquitos parece que ficaram lá quietos
lendo walter benjamin comigo na tela do laptop

nessa era de reprodutibilidade técnica
os mosquitos se repoduzem
e o sono perde a aura


minha namorada é uma visionária

minha namorada é uma visionária
ela vê coisas

outro dia ela disse que viu deus
num vira-lata de rua

no outro
ela disse que viu a presença de deus
numas bolhas de sabão na praia de icaraí

hoje ela disse
- estou com saudade de você e de mim.

As Leis da Poesia - segundo Charles Chaplin

- para você, que quer escrever um poema, mas não sabe por onde começar:

1 - pare.
2 - feche os olhos.
3 - quando digo olhos estou me referindo a você imaginando você de olhos fechados.
4 - troque o formato do seu rosto.
5 - pinte tudo de preto e branco
6 - dê uma flor para uma moça
7 - fuja do guarda
8 - caia no chão
9 - abra os olhos
10 - pare