quarta-feira, 31 de outubro de 2012

tudo trocado

vai-se até o arpoador de bicicleta
para não gastar dinheiro com ônibus
até porque não tenho troco

mas tudo trocado

sobe nas pedras
e olha o mar

de novo
lembro de nós dois nus
com o mar batendo na pedra
e fazendo espumas

lá no horizonte
dá pra ver monet

de perto
toda pedra é um ser
mais importante do que eu

seria melhor que as bicicletas
carregassem homens
e descansassem nas pedras
e que o mar olhasse a gente
e lembrasse de uma transa
dele com o tempo.

tudo trocado.

ontem não dormi por causa dos mosquitos

ontem eu não dormi por causa dos mosquitos e do calor
e também porque estava com muitas coisas na cabeça
fui ler walter benjamin para ver se dormia
fiquei com mais coisas na cabeça ainda
e mais calor

mas os mosquitos parece que ficaram lá quietos
lendo walter benjamin comigo na tela do laptop

nessa era de reprodutibilidade técnica
os mosquitos se repoduzem
e o sono perde a aura


minha namorada é uma visionária

minha namorada é uma visionária
ela vê coisas

outro dia ela disse que viu deus
num vira-lata de rua

no outro
ela disse que viu a presença de deus
numas bolhas de sabão na praia de icaraí

hoje ela disse
- estou com saudade de você e de mim.

As Leis da Poesia - segundo Charles Chaplin

- para você, que quer escrever um poema, mas não sabe por onde começar:

1 - pare.
2 - feche os olhos.
3 - quando digo olhos estou me referindo a você imaginando você de olhos fechados.
4 - troque o formato do seu rosto.
5 - pinte tudo de preto e branco
6 - dê uma flor para uma moça
7 - fuja do guarda
8 - caia no chão
9 - abra os olhos
10 - pare

vejo um filme

apagam as luzes
eu vejo um filme
chamado poesia

faltou poesia
no filme
eu to cansado de filme
que termina com suicídio

eu quero ver
e fazer filmes
que terminam com nascimentos


pretinha

tem uma gatinha num prédio aqui perto chamada pretinha que toda vez que eu faço um som com a boca ela vem se rebolando toda com a pançona gorda dela ela é bonitinha tem que ver e fica ronronando quando eu faço carinho ela já se joga no chão e fica como se tivesse coçando as pedras portuguesas da calçada

disseram que ela já morou na rua
eu lembro de ser criança e ela estar lá
ela é bem velhinha

decidi andar até a minha casa

decidi andar até minha casa.
cortei a cidade ao meio.
tudo isso pra provar pra mim mesmo
que a cidade é apenas um rio.

rascunho que achei hoje

consegui identificar nos teus olhos
um traço do meu futuro

(sabe aquelas partes brilhantes dos olhos?)


só a poesia salva

troque sua pistola por um disco do cartola

troque sua granada por um soneto pra amada

troque sua propina por uma dança da pina

troque seu caverão por um livro do drummão


sábado, 20 de outubro de 2012

tempestade

chove lá fora ou é meu estômago
a cidade tem fome ou sou eu tempestade

o mundo agora é diário secreto
pra todo mundo ver-se na água

meus versos vão em dupla
em vão, nus, sem culpa banhados no tempo

chove lá fora ou é aqui dentro
a tempestade secreta das coisas que invento

o mundo, diverso, universo, encerro em casa
pra todo mundo ver que em tudo há um grande gigante que

nada



segunda-feira, 8 de outubro de 2012

sentinelas da noite escondidos em nuvens

sentinelas da noite escondidos em nuvens
um silêncio afogando os prédios
cães em outro bairro debatem o tempo
mães em silêncio sonham no passado

gatos brigam na beirada de muros
algum grilo desaparece de si mesmo
no japão já é outro dia
coração ainda bate acelerado
era pra cidade dormir agora
mas os prédios insistem em sonhar

uma moça tira o sutiã
coloca o pijama
e desliga o computador

parece algum alarme de carro
lá no final da rua
ou será minha respiração?

nessa noite tão escura
escondem no asfalto preto dessa rua
um suave leito da visão

pareceu um navio atrás do morro
e nem estou dormindo
sonho acordado submerso em vida
ou a vida sonha com o verso findo?

escuto meu coração batendo fora de mim
nas paredes e no teto
bate também por entre os prédios
é com o coração que arquiteto

sonhos sólidos
metro a metro
até chegar

longe do perto