terça-feira, 29 de janeiro de 2013

então era isso

então era isso
eu já imaginava
faltava alguma coisa
nessa madrugada
algum claro enigma
decifrar o som do nada:
faltava escrever isso

que coisa louca
não se pode mais dormir
é preciso trocar essa reza
de cabeceira
por um poema
de canções surdas

só eu vou escutar mesmo
aquilo que nunca cantei

enquanto você que lê
inventa uma cobra coral
dentro do corpo
como uma serpente mitológica
engolindo o próprio chakra
enquanto isso o poema se consome
e some

então era isso
era preciso ser outros
era um caminho impreciso
ser outras pessoas
orientar-se pelo oriente
faltava achar a voz
bem baixinho

seria preciso desfazer o ritmo
para dançar
o movimento de ficar parado

a superfície impenetrável do ar

moon dreams

ouço essa música
e consigo ver nós dois flutuando
só um pouquinho acima do chão
num musical inventado
em preto e branco
na orla dessa cidade
e a lua cheia sorrindo no céu

a lua sonha a gente


solo 1

flores na janela da sala e eu pensando em alguma coisa para melhorar a minha vida e a de meus semelhantes não olhar pra trás não olhar para trás jamais seguir andando seguir os Andes

flores na chuva
cidade cinza
nuvem solar
achar a comida de pássaro e voar

teus olhos separam o que é real
obrigado, flores
flores na chuva
eu só preciso continuar seguindo
continuar na chuva

minha floresta de mims
nasce, cresce, morre e nasce

natureza morta
vivendo em quadros
na paisagem mental

podem ser girassóis
podem ser apenas o verde das árvores
ou serei o verde em mim que se faz humano

natureza morta
flores na chuva

yin e yang
ali naquele escuro

júpiter sincero aguarda um estalo
entre o solo de silêncio e luz
dos parâmetros tortos na calçada
ela pula um cocô de cachorro
com a leveza cega de um Nijinski

motocicleta feita de vento
impossível conter o movimento
motocicleta feita de corpo
espaço aberto ao vigilitante desatento
solos que a cidade esqueceu
um saxofonista rasteja nú pelo chão
sobre um cimento ciumento em cima no centro
próprio umbigo
vão




quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

esperar

escrever até entrar em transe
reconhecer que não é você ali
mas é mais você do que se fosse

esperar a noite chegar
o silêncio gritado dos animais
atrás, atrás do morro do prédio

esperar o silêncio dos apartamentos
as janelas quase fechadas
algum radinho de pilha bem baixo

esperar que o eco dos cães
se perca no próprio escuro da noite
e de alguma forma se transfigurar em latido

esperar que o som desencontre o seu sentido

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

ossos de tijolo

não é que não há nada para ser escrito
pelo contrário

eu poderia falar dos moleques aqui do play
falando alto
e já é madrugada

ou da noite
falar de como está quente
repetir de novo aquela estória de
"a cidade dorme"
ou outra merda qualquer

de qualquer forma não ligo
to pouco me lixando

a gente continua a falar
ou escrever
para escreviver
serestar na madrugada
quase nada

não é que tudo tenha que ser escrito
mas quase

eu tive um professor
um mestre
chamado Evaldo
e ele escreveu um livro chamado
"Retalhos do Quase Nada"

eu gostei muito desse título
gosto até hoje

o manoel já disse que escrever nadas
ajuda a gente a ficar mais cheio de ocaso

de noite, na parede do quarto, os ossos de tijolo do prédio exalam ócio

domingo, 6 de janeiro de 2013

ouvindo coltrane

a noite vai vestindo o seu manto negro sobre as coisas imateriais
e eu percebo o quanto não existo
madrugada cai da janela do quarto
foge no passado um som dissipado
estranho
já sonhei com esse lugar
antes
negras curvas do corpo iluminado
uma moça triste sorria
um pássaro sorria
na janela do passado
e lembro de uma estória

tínhamos apenas um segredo
eu e ela
eu era uma porta
e ela uma janela

ouvindo john coltrane
deixando que a escuridão
queime

ouvindo toninho horta
fico sentado no chão
olhando a porta

ouvindo djavan
parece um dejavu

nesse sonho ou pesadelo
seu rosto vem distorcido
onde tudo é mais bonito
eu arranho seu cotovelo

um amor supremo

está mais quente
faz calor no rio de janeiro
até o vento sente
e se esconde