não há absolutamente nada ao nosso redor. nem neblina, nem escuridão.
esse homem me acena e chego mais perto. prazer, me chamo eric satie.
eu conheço você, gosto muito de suas músicas. obrigado. quero te mostrar
a minha mais nova composição. então ele abriu os braços e um piano de cauda
apareceu na sua frente, e ele começou a tocar uma melodia distante. a melodia
de fato estava distante, como que se não estivesse saindo desse piano, e sim de
algum lugar bem distante. tanto que havia uma dessincronia entre o gesto dele
e o som. foi quando a melodia me levou, entrando debaixo dos meus pés, para
longe dali. era um campo florido, mas as flores eram cabeças de pessoas com
kokares indígenas de penas coloridas. elas, como girassóis, sorriam em direção
aos raios solares. quando cheguei no lugar, carregado pela melodia, as cabeças
começaram a cantá-la e fiquei preso, sem conseguir me mexer. dessa vez, a melodia
me circundava e girava sobre meu corpo, criando um campo de força que, como
uma corda invisível, me mumificava naquela metáfora. fui enterrado junto das cabeças.
aos poucos sinto os pequenos insetos daquela terra roxa se alimentando de meu
corpo melódico. vou me dissolvendo em notas musicais que penetram a lama.
o que sobra é minha cabeça, agora ornada em flor. canto