sábado, 18 de agosto de 2012

voa pensamento

vôa na madrugada um pensamento
passeando apressado
por entre acordes de piano
e cidadãos indo dormir

a cidade calma, serena, espera o sol
na solidão dos poucos carros
das luzes coloridas
dos papéis que se arrastam ao vento
um olho de gato brilha
um homem dorme envolto em papelão
meu coração se aproxima do mundo
como se fosse o próprio vento
um bafo de algo maior, mais profundo
mas é apenas o vento

o pensamento, voando
pousa de passagem
nas asas de algum sonho
que alguém deixou por sonhar
na beira da cama

parece um filme antigo
em preto e branco
mas não
é a própria história da humanidade
encarcerada na vontade de ser feliz
e de voar pensamentos
e num breve momento
o pensamento se olha em reflexo
e ri desse espelho maluco

a imagem se desdobra em relógios
pendurados no pescoço de santos
que se multiplicam na paisagem dormente
cercando a cidade num ataque aéreo
os ponteiros jogam pequenas bombas de tempo
e os segundos vão caindo
acordando os homens
e adormecendo as crianças
envelhecendo as mulheres
e as plantas que vivem em busca da luz

o pensamento não pára
e continua voando
seus olhos agora pesados
pestaneja, chega a dormir
e num sonho
parece que acorda ao som de acordes de piano

na madrugada uma sinfonia de luzes coloridas
e pequenos fragmentos do vento
de outros tempos, muito tempo atrás
vêm distorcendo a cidade, as ruas, os homens
os sonhos das crianças

andando no asfalto vazio
o pensamento vê uma asa cortada
metade de uma asa
metade de um sonho
sente um desconforto na coluna
e repara, é sua outra metade da asa

não é sangue que se esvai
é um rolo de filme mudo
envolto não pelo vento
mas por alguns acordes no piano
de algum sonho perdido
do século passado
o filme se desenrola em guerras em danças e músicas mudas
rolando ladeira abaixo na cidade
rolando ladeira abaixo no equador
dando a volta na Terra e se encontrando novamente com o pensamento
que se vê enrolado

mumificado em ser humano
condenado a ser livre

fica todo coberto
completamente submerso em ficção
até os olhos cobertos começarem a sonhar
as imagens
pequenos fragmentos de tempo
cortados como frases
que alguém balbuciou
em algum sonho
que alguém deixou por sonhar
na beira do mundo
na beira do dia
que já acorda a cidade
pronta para sonhar
com novas madrugadas
novos ventos
de tempos atrás

dorme o pensamento
mumificado em cotidiano
condenado a ser livre
pronto para sonhar
com novas madrugadas
novos ventos
tempos atrás




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