sexta-feira, 16 de novembro de 2012

minha identidade também está lá

perdi o medo de escrever poesia há muito tempo, mas parece que por agora, estou perdendo o medo de escrever prosa também. eu e minha namorada tivemos nossos roteiros selecionados para um laboratório de roteiros. de curta-metragem. cada um com um roteiro diferente. foi bem legal. engraçado que o roteiro de ambos falava sobre relacionamento de casal, cada um da sua maneira. tanto que fomos colocados no mesmo grupo de trabalho - apelidado carinhosamente de grupo do amor.

lendo o roteiro de cada um dá pra perceber coisas sobre nosso próprio relacionamento. e também ver, de alguma forma, como cada um vê ou já viu um dia. o meu se chama Bebel Berlin e o dela se chama Expresso. eu gosto dos dois nomes. gosto dos dois roteiros. cada um tem uma cara. o meu é mais anárquico e chega a ser imbecil. o dela é mais bonito, parece coisa de filme asiático contemporâneo.

escrever roteiro parece um pouco como escrever em prosa e escrever em poesia. só que é diferente. tem muita tradução num roteiro. você fica traduzindo a língua das imagens da mente e dos olhos e dos ouvidos. cada imagem dessa tem uma língua diferente, então é uma tradução simultânea danada, que às vezes comete erros. o melhor dessa tradução são os erros. como na poesia, quando a criança erra na gramática, acerta na poesia. na poesia parece que não há tradução, no caso, quem traduz é a própria poesia. ela te lambe, lambe a tua língua, e deixa a baba nas palavras que sobraram. a prosa é mais como um ditado, você vai vendo de ouvir.

tenho ouvido daft punk e entendido melhor o porque de estar ouvindo daft punk. tem tudo a ver com tudo. inicialmente o que mais me atraiu foi o clip do gondry para a música around the world. percebi que gosto desse diretor. justamente porque ele trabalha num lugar que também gosto, ele fica fazendo muitas coisas do início do cinema, coisa de méliès e lumière. e daft punk é como se fosse manoel de barros em forma de música tocado não por gente, mas por objetos de um ferro velho. repetir, repetir, até ficar diferente.

quando vi viagem à lua do méliès percebi o caminho que o cinema que quero fazer e ver mais deve explorar. viagem para lugares nunca antes vistos. por isso que a galera gosta de apichatpong weerasethakul, cineasta tailandês. ele mostra coisas que a gente nunca viu. nem ele viu. ele mostra coisas que até a gente não está vendo.

e continua de pé, agora mais forte e já iniciado, o tal roteiro de longa-metragem que estou escrevendo. por alto, eu sei que ele fala da paesificação do rio e das coisas. dessa transformação rápida de tudo em barra da tijuca, em babaquice. mas, por mais louco que seja, quero que seja um filme pra cima. vai ser uma comédia. sobre a paesificação do rio. eduardo paes. não vai ser sobre isso, mas esse sentimento vai ficar no filme. de repente eu posso apontar alguns caminhos pra despaesificação, como a poesia e etc. o mais interessante no filme é esse etc. eu nem sei o que tem. mas sinto que vai ter coisa bacana.

todo escrito é uma estória de amor. e eu só escrevi essas merdas todas porque tô com saudade da carol.

o rio tem amanhecido meio frio. tem feito um climinha bem de feriado daqueles tranquilos. feriados pra ficar em casa. eu até gosto. dá vontade de ficar na cama lendo alguma coisa. ou baixar um filme. tava vendo ontem o hana-bi, fogos de artifício, do takeshi kitano. me pareceu um filme bem interessante. achei maneiro o jeito que ele fez esse filme. um dia, quando eu for mais velho, gostaria de ter essa cara de mafioso da yakuza. vai ser difícil, afinal, ele ganhou aquela cicatriz e aquele tique nervoso de paralisia por causa de um acidente de moto em 94. mas ter uma cara de mafioso seria bom. dá pra intimidar as pessoas. isso numa cidade grande é importante. principalmente flanelinhas.

parei agora para ficar olhando o quarto e procurando um título para esse texto. acho que já está bom de escrever. chega. olhei os livros na estante. o ventilador meio velho. meu armário que tem as portas quebradas. a janela que ainda está semi-aberta. posso até ver o verde e o cinza lá fora. e escutar os pássaros. ao meu lado tem um livro do drummond com a cara dele na capa. do outro tem kafka naquela edição da martin claret feia pra cacete. a calça que eu usei ontem está pendurada com cinto e tudo. ainda tem moedinhas no bolso. tenho que pegar. minha identidade também está lá.


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