tava tudo mais ajeitado, pintadinho, diferente de quando eu estudei lá,
quando as coisas eram mais largadas, as paredes descascando,
o chão velho e mais sujo.
para minha surpresa, a moça da cantina (que desde quando eu comia lá já
tinha passado de ser moça) estava lá, com a toquinha branca e a roupa branca.
ela tinha um problema na fala. dizia "fagango" em vez de frango.
a gente pedia para ela dizer, de propósito, só pra ver ela falando errado.
o pátio onde a gente jogava bola, que na verdade era uma gaiola, tinha desaparecido,
virado sala. eu cheguei lá na hora do recreio. tava cheio pra caramba. num tinha lugar direito,
num tinha espaço aberto pra criançada brincar. achei isso ruim.
imagina. ficar sem jogar bola no recreio?
pelo que eu vi, o recreio virou um bololô de gente meio indefinido. todo mundo em pé.
faltava alguma coisa.
acho que eu cresci, porque as coisas pareciam muito menores, mas muito mesmo.
em vários trechos eu tinha que abaixar a cabeça. numa parede de pedras, que tinha perto
da entrada, onde eu brincava de escalar, agora eu alcançava o teto só levantando o braço.
mas o pior mesmo foi ver que a goiabeira tinha desaparecido também.
a goiabeira não existia mais!
conversei com uma professora que me contou que caiu um raio na pobre da árvore, e que no dia seguinte só tinha cinza no lugar. a goiabeira! o pátio a gente chamava de pátio da goiabeira.
debaixo daquela goiabeira muitas coisas a gente aprendeu:
- lei de gravidade: a goiaba de vez em quando caía na cabeça de um. se fosse na nossa doía, se fosse na dos outros, era engraçado.
- romantismo: as meninas gostavam de sentar e conversar ali embaixo, se fosse só você e elas.
- pique: geralmente a gente usava a goiabeira como poste-pra-pique. aprendí ali a fingir a contar até cem.
- sombra: as árvores são funcionadas para dar sombra em dias quentes.
- escalar: os troncos me aguentam mas não os gordos da sala.
- germinação: a gente tentava plantar coisas na terra da goiabeira, como: milho, semente de laranja, semente de melancia, bola de gude, lápis, feijão, batata rufles....mas não cresceu nada.
- poesia: ali era um bom lugar para nada, ou seja, para poesia.
tentei olhar aquele pedaço de chão pintado e não enxergar de novo a goiabeira que costumava morar ali.
consegui não enxergar.
consegui ver nada.
Eu já tinha vindo aqui, tem muita coisa bacana. Mas eu tinha ficado com vergonha de comentar o.O
ResponderExcluirEnfim.. porque as coisas parecem tão maiores na infância? Principalmente os espaços..
Parabéns pelo conjunto da obra, tá? Tem muita coisa boa aqui.