sábado, 17 de março de 2012

um poeta morreu

soube que um poeta morreu. toda vez que morre um poeta nasce uma prosa. uma rosa no apartamento, ou no asfalto. em breve serei eu a morrer também. e você que está lendo (ou não) o que escrevo (ou não). assim como a morte é a certeza da vida, a poesia é a incerteza. a morte de um poeta é uma espécie de buraco negro.  suspensas as leis do universo, emanam-se do escuro infinito as leis do verso. como que cega, a noite tateia as montanhas. a cidade parece dormir. ao fundo, bem no fundo da paisagem, consigo ouvir os sonhos da cidade que dorme. uma sinfonia de lembranças, riscando o céu negro com perfumes doces. mais ao fundo, uma criança tem um pesadelo. tem medo de morrer. acorda seu pai, assustada. minha filha, tudo não passou de um pesadelo, vai dormir. o cão também dorme. sonha com pulgas e ossos. as pulgas do cão sonham com circos na china. a china está já acordada, no horário do almoço. um moço na china escreve um poema. desenha um poema com ideogramas. idéias sem peso. não há gravidade na china. e aqui está tão noite que as palavras também dormem. as palavras sonham com poetas.

Um comentário:

  1. muito bom! boa sorte com o livro sobre seu avô...

    e atendendo ao convite:

    SALA DE ESPERA

    #3
    Um poeta nasce. É pobre,
    tísico e funcionário público.
    Mas é um poeta,
    que a estrela que rolou
    bem alto no céu nos disse.
    Será perseguido por reis
    ditadores e outros grandes líderes.
    Será excomungado pelo Papa
    e logo condenado
    por seus camaradas.
    Com medo, se exilará.
    Durante alguns anos viverá
    de sentir amor e raiva.
    Sua mulher de nuvem
    se perderá num vento muito forte.
    E nosso poeta quedará só
    cem anos seguidos.
    Depois oportunamente morrerá.
    Tudo isso pra que nos seja perdoado
    um século de pecados.
    Outros nascerão.

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