eu de cabeça pra baixo riscava um disco* com minha cabeça
e o som que saia contava histórias que a humanidade sonhou
soldados com cigarros de chocolate pintavam murais
e um exército de poetas fuzilava um altar relogioso (religião que elogia duas vezes o tempo)
no altar três desobjetos:
um segredo escondido no canto de um percevejo de plástico
uma régua de desmedir o mundo
a cabeça de milton nascimento em bronze
joaninhas faziam poemas em bando
e minha mãe dava de mamar a um bezerro
na beira de uma menina tinha um mar morto
e um pedaço de corda
umbilical
as palavras para definir as coisas
eram impronunciáveis
cigarra cantava até amanhã
um cão contava causos ossais
minha namorada era muitas
e sonhava acordada com cores de uma música desclássica
tinha mato, internet e livros
e tinha muito pouco quase nada de tudo
`as vezes um silêncio costurava promessas com fios de cabelo da minha vó
`as vezes fazia uma tenda de circo
`as vezes o silêncio cantava só
enquanto a noite escalava a cordilheira dos sonhos
*o disco era o Clube da Esquina n:1 (1972) de Milton Nascimento e Lô Borges, o disco que me mostrou o futuro que eu tinha esquecido e rabiscou com tinta de luz as paredes da minha memória infantil. (nota do autor)
é, também, um prazer imenso ler as tuas memórias, as tuas nostalgias sincretizadas com o poeta que és!
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