quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Encontros com Taiyo Omura

Aline - Lendo os teus poemas, a gente fica curioso: de onde vem a poesia?

Taiyo - Pode ser que ela venha dos seres que não somos, mas dos quais não conseguimos fugir. Pode ser.

Aline - É... e você é muitos seres?

Taiyo - Carrego dentro de minha mochila não só livros e cadernos de aula. Guardo também algumas máscaras, que uso dependendo da ocasião social. Outras eu não uso. Outras me usam. Tem uma que é um espelho, é uma máscara no formato do meu rosto, mas é um espelho. Essa eu uso quando quero me mostrar, sabe, coisa de vaidoso mesmo.

Aline - Coisa de quem é de leão, como nós. Diga, você se mostra muito na poesia? Se coloca nela?

Taiyo - Às vezes é como sexo. Eu gosto de ficar por cima das palavras, roçar nelas e variar na metida, pode ser rápido, mas lento também é bom. Eu gosto quando as palavras gozam enquanto estou dentro delas. Elas ficam muito molhadas de mim. E eu delas. Mas com elas por cima também é ótimo. Quando elas cavalgam em cima de mim, tenho vontade de abrir os braços e voar, como Pégaso.

Aline - Hummmm... eu sinto uma coisa meio mítica na sua poesia, por falar nisso.

Taiyo - Deve ser porque, pra mim, a poesia é inventar os seus mitos. E inventar O mito. É contar a sua história e a História pra você. É verdadeiramente um ato mentiroso de encontrar-se com o seus tempos: digo seus por uma razão simples: a desrazão. Isso me lembra Chris Marker, no filme La Jetée, onde o personagem viaja no tempo, pela memória, ou seja: ele vai tanto para o passado quanto para o futuro. temos todos os tempos dentro de nós. temos a memória do futuro. É desse mito que eu falo. É dele que eu bebo.

Aline - Falando em cinema, o que você busca nele? Você é discípulo do meu Jodo?

Taiyo - Sou. Sou discípulo do Jodorowsky no sentido de acreditar no cinema, ter fé nele. Quando o mestre diz que o cinema está doente, e que estamos doentes, está correto. Eu procuro no cinema um remédio para as minhas doenças e para as doenças do mundo. Tem uma que não dá pra curar e nem quero, que é a poesia. Todas as outras doenças podem ser curadas, inclusive e principalmente pelo cinema. A poesia é uma doença que cura... interessante isso.

Aline - E quando que a poesia te infectou?

Taiyo - Acho que foi quando eu li Pessoa.

Aline - Eu gosto de pensar que o nome dele é Fernando Pessoas.

Taiyo - O Gullar disse a mesma coisa. O Pessoa na verdade é Pessoas. Ele tem dentro dele todos os sonhos do mundo. Ser poeta é isso, não caber em si mesmo. A vida não basta.

-----------------------------------------------------
Primeira parte do encontro com a artista Aline Barcelos,
quando fui entrevistado no ano que vem.

4 comentários:

  1. Eu também sou disciplo do Jodo; sou seu excravo, embora ele não saiba.

    ResponderExcluir
  2. Que sorte, han, Jodo?

    E que bela entrevista, que final lindo....aliás, a gente não devia nunca mais falar nada porque o GULLAR JÁ DISSE TUDO.

    ResponderExcluir
  3. Mas Taiyo! Ainda há aquelas outras perguntas que eu ainda não sei falar em palavras.

    ResponderExcluir
  4. (risos)
    eu acho que se a gente tivesse gravado a entrevista teria umas duas partes que eu falaria de mim!
    (risos)

    ResponderExcluir