olhei no email a sua despedida final
e novamente concluí a indiferença
das palavras virtuais, da própria virtualidade
olhei no email a sua despedida final
foi para a Europa, levando meu filho
irônico destino, lembrando aquele verão
seu rosto era mais jovem antes do acidente
mas desde aquela época você mentia
dizia querer rodar o mundo apenas
e eu embarquei numa viagem sem volta
na verdade sem ida, meu coração era vento
depois de ler novamente o email
deletei-o como quem apaga o próprio passado
mesmo a memória sendo feita de vida latente
que ainda pulsava incessantemente na minha retina
daqui do alto desse edifício a cidade é uma maquete
acho que quero voar, diferente daquela vez que recusei
nas nossas férias de julho
voar não pode ser brincadeira, eu acredito
entre todos os eufemismos eu escolho o efêmero
vou me jogar daqui, acho que vou
é teatral demais para uma poesia, mas vou
apesar de não ser tanto uma poesia, mas vôo
e de repente num passo em falso o vão se faz chão
flutuando sobre o ar o corpo humano cresce
alonga-se pela concretude dos gazes e vai minguando sua Lua
enquanto flashes do email alteravam a fisionomia das coisas
minha cabeça girava ou era a rotação terrestre?
o contato com o asfalto se deu de súbito
e o escuro também rapidamente se desfez em papel
as páginas caindo dos olhos, a sensação de retorno
o eterno retorno dos Heróis consumia a poesia
o papel de luz e dígitos camuflados brilhava
era a tela do computador, interlocutor do esporte-vida
contando baixinho o placar do novo jogo do amor
1 X 0 para mim mesmo
o email, sua despedida final, já nem é sua
o que se escreveu foi uma história nula
a transformação veio antes na realidade que na imaginação
como toda história deve surpreender
reescrevendo a memória que não me era
encontrei a resposta para o que nunca perguntei
naquele teu email, que não era teu, que meu talvez fosse
num momento os mitos estão no pão e na faca:
histórias em pedaços de elétrons.
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